sábado, 15 de agosto de 2015

Pesquisador brasileiro Ricardo Diaz lidera nova pesquisa em busca da cura da aids

Fonte: http://agenciaaids.com.br/home/noticias/noticia_detalhe/23818#.Vc-CE0o4-rU

A cura da aids está mais próxima, acredita o pesquisador e infectologista Ricardo Diaz, da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo). Atualmente, ele lidera um estudo no Brasil, que visa eliminar o HIV das células. Uma das grandes novidades desta pesquisa, segundo Ricardo Diaz, é intensificar o tratamento antirretroviral já usado pelo paciente com mais duas drogas, o dolutegravir e o maraviroque. O infectologista está certo de que a combinação de estratégias contra o HIV é o caminho mais seguro a ser trilhado, segundo nos conta na entrevista a seguir:

Agência de Notícias da Aids: Como estão as pesquisas que o senhor coordena  em torno da cura da aids?
Ricardo Diaz:  A pesquisa da qual participo é exclusiva da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). É um estudo com patrocínio do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), da Fapesp e do laboratório ViiV Healthcare.
Como é essa pesquisa e em que estágio ela está?
Na nossa pesquisa vamos fazer intensificação de antirretroviral. Ou seja, vamos dar mais remédios. Faremos a intensificação com mais duas drogas,  o dolutegravir e o maraviroque. Essa é a primeira vez que o dolutegravir é usado para intensificar o tratamento, visando a cura. O que me deixa bastante orgulhoso é que  outros pesquisadores de diferentes partes do mundo também estão solicitando esse medicamento para estudo de cura. No entanto, a permissão para usar a droga é só do Brasil, justamente porque eles acharam que era o estudo com mais qualidade.
Quais são os obstáculos para a cura da aids?
Existem três. O primeiro é que o tratamento antirretroviral atual ainda é fraco, ele não consegue suprimir todo o vírus que está se multiplicando no corpo de uma pessoa. Se a pessoa que tem carga viral indetectável usar um método mais sensível de carga viral para uma cópia, e não 40 como é normalmente usado, 80% dessas pessoas terão carga viral detectável.  Conheço muitos  estudos de cura que tentaram fazer intensificação do tratamento, ou seja, dar mais remédios. Não funcionou, principalmente porque foi uma tentativa isolada, não combinada.
Quais são as outras barreiras da cura?
A segunda barreira é o fato de que o vírus entra em latência e fica meio encasulado. Ou seja, na hora em que ele entra no corpo ele desliga a célula e não se multiplica, mas quando paramos com o remédio ele volta a se multiplicar.  Então, estamos usando dois medicamentos para tirar o vírus da latência, porque, se ele acordar, o remédio do coquetel antirretroviral funciona.  No nosso estudo, vamos usar dois medicamentos que nunca foram usados em humanos para esse fim. Um deles é a vitamina nicotinamida, que tem esse papel de tirar o vírus da latência. O outro é um sal de ouro, que é usado para crise de artrite reumatoide. A droga foi testada em macacos e mostrou que funciona. A terceira barreira para não curar as pessoas é que o vírus fica escondido em santuários. São lugares onde o remédio não chega direito, mas o vírus está lá. Estou falando de cérebro, testículos, ovário, algumas partes do intestino. Para vencer isso,  estamos fazendo uma vacina de célula dendrítica. Esta consiste em tirar o sangue da pessoa, recuperar o vírus dela e fazer a vacina. Na hora que a gente injeta as células na pessoa, estas são capazes de ensinar as outras a irem neste santuário e matarem o vírus escondido lá.
O senhor afirmou que hoje o tratamento é fraco. Podemos considerar o dolutegravir e o maraviroque como drogas fortes contra a aids?
De fato, o tratamento é fraco. Com esse estudo, nossa ideia é associar mais remédios. Então, naquele tratamento que a pessoa está fazendo, ela vai tomar mais dois antirretrovirais – esse é o conceito da intensificação. E como o dolutegravir é o remédio mais forte que existe até o momento, a gente acha que ele vai ser ideal para a intensificação.  O maraviroque também é bom porque, além de funcionar como antirretroviral, diminui a inflamação das pessoas. Ele tem também tem o papel de acordar as células latentes.  Acreditamos que essa será uma associação muito promissora.
Quantas pessoas participam deste estudo no Brasil?
Serão recrutados trinta pacientes. Este é um estudo piloto, considerado prova de conceito. Todos os estudos para cura são assim: pega-se uma quantidade pequena de pacientes e tenta-se determinar se o estudo se aproxima, no caso, da diminuição da quantidade de vírus no corpo e da  inflamação. Neste momento, estamos recrutando um grupo no qual acreditamos que a cura vai ser mais fácil. São pessoas que foram tratadas relativamente cedo e nunca tiveram o CD4 menor do que 305. Assim, sabemos que a quantidade de células latentes que o paciente tem é menor e isso facilita  a eliminação das mesmas. O paciente também precisa estar com a carga viral indetectável por pelo menos dois anos.  Eles serão divididos em vários braços do estudo e, no decorrer das pesquisas,  vamos entender direito o que está funcionando, o que está melhor. Assim, poderemos escolher as melhores estratégias e até remanejar um voluntário de um braço da pesquisa para o outro. 
Qual é a relação entre o tratamento precoce do HIV e a cura da aids? 
Como eu falei, o vírus vai entrando em latência e essa é uma barreira grande para a cura. Uma quantidade de células simplesmente se desliga e o vírus fica lá quietinho. Essas células latentes vão aumentando de forma progressiva. Depois de um ano de infecção, a pessoa tem mais células latentes do que tinha no momento que ela se infectou. Depois de dois anos, ela tem mais ainda, então, quanto mais o tempo passa sem tratamento, mais as células aumentam. As pessoas que tratam mais precocemente estão mais próximas da cura porque têm uma barreira menor a ser vencida.

O senhor já disse que o HIV não infecta nenhuma célula definitiva do corpo humano, como os neurônios. Pode explicar isso?
O HIV, para entrar nas células, precisa de alguns receptores, como CD4, CCR5, CXCR4... O que descobrimos é que no corpo há células que são  produzidas,  morrendo e sendo substituídas. Outras são definitivas e são justamente as que não têm esses receptores. Descobrimos que o HIV não infecta estas células definitivas. Então, isso é uma evidência de que podemos curar as pessoas. Se a gente eliminar todas as células infectadas pelo HIV, a gente cura, como já aconteceu. Foi o caso do paciente de Berlim.
O vorinostat, medicamento usado no tratamento de câncer, pode ajudar a ativar as células escondidas? 
Estamos usando um medicamento que não é o vorinostat, mas é da classe dele. É uma classe conhecida como inibidor das deacetilase, que faz com que o vírus acorde.   Existe um outro melhor ainda que está sendo testado,  o panobinostat. Durante o estudo in vitro, a gente descobriu que a vitamina nicotinamida, que é também um inibidor de deacetilase istônica, é muito mais potente para tirar a latência do HIV.
Essa é a principal novidade desse estudo sobre cura?
Têm várias novidades. É o único estudo no mundo que vai fazer a intensificação com dolutregravir. O único que está usando dois medicamentos para a intensificação. A terceira novidade é que estamos usando ácido valpróico.  E é a  primeira vez, também, que usamos  sal de ouro em seres humanos e  vacina de células dendrítica em estudo de cura.
O que podemos esperar primeiro, a cura da aids ou uma vacina preventiva?
Acho que estamos mais longe da vacina preventiva. Primeiro, vem a cura da aids. Todos os estudos de vacina têm sistematicamente falhado. Mas há cientistas que acreditam na vacina.

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